AS CONCEPÇÕES DE ARISTÓTELES
A primeira grande teoria
filosófica da liberdade é exposta por Aristóteles em sua obra Ética a
Nicômaco e, com variantes, permanece através dos séculos, chegando até o
século XX, quando foi retomada por Sartre. Nessa concepção, a liberdade se opõe
ao que é condicionado externamente (necessidade) e ao que
acontece sem escolha deliberada
(contingência).
Diz Aristóteles que é livre
aquele que tem em si mesmo o princípio para agir ou não agir, isto é, aquele
que é causa interna de sua ação ou da decisão de não agir.
A liberdade é concebida como o
poder pleno e incondicional da vontade para determinar a si mesma ou para ser
autodeterminada. É pensada, também, como ausência de constrangimentos externos
e internos, isto é, como uma capacidade que não encontra obstáculos para se
realizar, nem é forçada por coisa alguma
para agir. Trata-se da
espontaneidade plena do agente, que dá a si mesmo os motivos e os fins de sua
ação, sem ser constrangido ou forçado por nada e por ninguém.
Assim, na concepção aristotélica,
a liberdade é o princípio para escolher entre alternativas possíveis,
realizando-se como decisão e ato voluntário.
Contrariamente ao necessário ou à
necessidade, sob a qual o agente sofre a ação de uma causa externa que o obriga
a agir sempre de uma determinada maneira, no ato voluntário livre o agente é
causa de si, isto é, causa integral de sua ação.
Sem dúvida, poder-se-ia dizer que
a vontade livre é determinada pela razão ou pela inteligência e, nesse caso,
seria preciso admitir que não é causa de si ou incondicionada, mas que é
causada pelo raciocínio ou pelo pensamento.
No entanto, como disseram os
filósofos posteriores a Aristóteles, a inteligência inclina a vontade
numa certa direção, mas não a obriga nem a constrange, tanto assim que podemos
agir na direção contrária à indicada pela inteligência ou razão. É por ser
livre e incondicionada que a vontade pode seguir ou não os conselhos da
consciência. A liberdade será ética quando o exercício da vontade estiver em
harmonia com a direção apontada pela razão.
Sartre levou essa concepção ao
ponto limite. Para ele, a liberdade é a escolha incondicional que o próprio
homem faz de seu ser e de seu mundo. Quando julgamos estar sob o poder de
forças externas mais poderosas do que nossa vontade, esse julgamento é uma
decisão livre, pois outros homens, nas mesmas
circunstâncias, não se curvaram nem se resignaram.
Em
outras palavras, conformar-se ou resignar-se é uma decisão livre, tanto quanto
não se resignar nem se conformar, lutando contra as circunstâncias.
Quando
dizemos estar fatigados, a fadiga é uma decisão nossa. Quando dizemos estar
enfraquecidos, a fraqueza é uma decisão nossa. Quando dizemos não ter o que
fazer, o abandono é uma decisão nossa. Ceder tanto quanto não ceder é uma decisão
nossa.
Por
isso, Sartre afirma que estamos condenados à liberdade. É ela que define
a humanidade dos humanos, sem escapatória. É essa idéia que encontramos no poema
de Carlos Drummond, quando afirma que somos maiores do que o “vasto mundo”. É
ela também que se encontra no poema de Vicente de Carvalho,
quando
nos diz que a felicidade “está sempre apenas onde a pomos” e “nunca a pomos
onde nós estamos”. Somos agentes livres tanto para ter quanto para perder a
felicidade.
texto de acordo com Marilena Chauí, Convite a Filosofia.
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