Manutenção do privilégio do sujeito do conhecimento
Conservando-se
fiel à tradição moderna e kantiana, Husserl privilegia a consciência reflexiva
ou o sujeito do conhecimento, isto é, afirma que as essências descritas pela
Filosofia são produzidas ou constituídas pela consciência, enquanto um poder
para dar significação à realidade.
A
consciência de que fala o filósofo não é, evidentemente, aquela de que fala o psicólogo.
Para este, a consciência é o nome dado a um conjunto de fatos externos e
internos observáveis e explicados causalmente. A consciência a que se refere o
filósofo é o sujeito do conhecimento, como estrutura e atividade universal e
necessária do saber. É a Consciência Transcendental ou o Sujeito
Transcendental.
Qual é
o poder da consciência reflexiva? O de constituir ou criar as essências, pois
estas nada mais são do que as significações produzidas pela consciência,
enquanto um poder universal de doação de sentido ao mundo.
A
consciência não é uma coisa entre as coisas, não é um fato observável, nem é, como
imaginava a metafísica, uma substância pensante ou uma alma, entidade espiritual.
A consciência é uma pura atividade, o ato de constituir essências ou significações,
dando sentido ao mundo das coisas. Estas – ou o mundo como significação – são o
correlato da consciência, aquilo que é visado por ela e dela recebe
sentido. Não sendo uma coisa nem uma substância, mas puro ato, a consciência é
uma forma: é sempre consciência de. O ser ou essência da consciência
é o de ser sempre consciência de, a que Husserl dá o nome de intencionalidade.
A
consciência é um ato intencional e sua essência é a intencionalidade, ou o ato de
visar as coisas, dando-lhes significação. O mundo ou a realidade é o correlato intencional
da consciência. Assim, por exemplo, perceber é o ato intencional da consciência,
o percebido é o seu correlato intencional e a percepção é a unidade interna e
necessária entre o ato e o correlato, entre o perceber e o percebido. É por esse
motivo que, conhecendo a estrutura intencional ou a essência da consciência, se
pode conhecer a essência da percepção (ou da imaginação, da memória, da
reflexão, etc.).
texto de Marilena Chauí, em Convite à Filosofia.
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